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18 de Abril de 2024

Tragédia em Brumadinho: acidente ou crime?

O "bis in idem" da vida na LAMA

Publicado por Paulo Campello
há 5 anos

Por Paulo Campello

No âmbito jurídico do direito penal o termo “bis in idem” refere-se a repetição de julgamento pelo mesmo fato. E, não é que a população mineira mais uma vez é obrigada a experimentar os dissabores com a ingerência na gestão de riscos de catástrofes, negligência do empresariado e imprudência da fiscalização do Poder Público. O rompimento da barragem I da Mina do córrego do Feijão, em Brumadinho/Minas Gerais, ocorrido na tarde de sexta-feira (25/01/2019), fez com que um “mar de lama” escoasse pelo curso, destruindo e rompendo todos obstáculos pelo caminho, e infelizmente deixando centenas de vítimas pelo caminho. Com efeito, observar-se-á que o know-how quando o desastre de Mariana não serviu de patavinas, já que aquela tragédia 2015 voltou a repetir-se.

A relevância desse assunto chama atenção para o programa do Criminal Compliance, especialmente na sua eficácia para Gestão de Riscos, mecanismos de Prevenção ou Precaução, bem como delimitação das responsabilidades, identificação da posição do Garante e apuração de eventual responsável para com a ocorrência de crimes. Pois, a priori, a tragédia de Brumadinho não se trata de questão de força maior ou mero acidente, mas sim de crimes por conduta (s) omissiva (s).

Mas, antes de abordar a responsabilidade penal em si, é importante relembrar a tragédia de Mariana, quando do rompimento da barragem de Fundão, no subdistrito de Bento Rodrigues, na cidade de Mariana/Minas Gerais, cerca de 32 milhões de m³ de rejeitos foram lançados ao meio ambiente, num verdadeiro tsunami de lama, atingindo afluentes, impactando mais de 660 quilômetros de recursos hídricos de Minas Gerais e Espírito Santo, passando por mais de 40 municípios, destruindo centenas de hectares de matas nativas, atingindo até o Oceano Atlântico, deixando pelo caminho um rastro de morte e extermínio de vidas humanas e seres vivos.

No caso em tormento, a Mina do Córrego do Feijão estreou suas atividades em 1956 por meio da Cia de Mineração Ferro, e Carvão. Em 1973, passou a ser controlada pela Ferteco Mineração e desde 2003 é gerida pela Vale. E tal empreendimento faz parte de um complexo de atividades correlatadas e complementares entre a Mina Córrego do Feijão e a Mina de Jangada, estando ambas Minas sob operação do mesmo empreendedor (VALE S.A.), cuja Licença de Operação (Certificado 032/2011) condicionou “devido controle ambiental e operações minerais. Frisa-se que a barragem I, da Mina do Córrego do Feijão, que rompeu na tarde de sexta feira era utilizada para recuperação de rejeitos, cujo processo acreditava-se ser capaz de reduzir a estrutura de barramento. Além disso, conforme Parcecer 0786757/2018 do Sistema Integrado de Informação Ambiental – SIAM do Governo de Minas Gerais, foram previstas medidas para drenagem e aceleração do adensamento, tais como: construção de tapete drenante, e enrocamento de pé primeiro banco estéril cima do lago de rejeitos e acima da cota de fechamento da cava. Notadamente essas medidas dispostas em dezembro 2018 não foram tempestivas, já que 51 um dias após a licença prévia (com validade de 10 anos) revelou a fragilidade das operações. Contudo, a Câmara de Atividades Minerárias do Conselho de Política Ambiental de Minas Gerais – CMI/ COPAM concedeu o prazo de 06 anos para instalações de todas as medidas impostas, ou seja, claramente um prazo além do razoável.

No Direito Penal moderno, quando observado para o cenário empresarial, vindica que dois institutos estejam associados: crimes de perigo e omissivos. Em meu livro (Criminal Compliance, guia para o empreendedor do século XXI) pactuo dos posicionamentos de que as condutas omissivas são dolosas por essência, contudo não deixo de considerar exceções pela culpa inconsciente (delitos de esquecimento). Notadamente, é preciso determinar se o Garante agiu prevento o resultado e se assegurou para que ele ocorresse, ou assumiu o risco do resultado. Entretanto, é notável que a atividade de mineração e gestão de uma barragem envolve elevado risco frente os perigos previsíveis ou prováveis, o que intensifica o dever legal de agir para evitar o resultado, e para isso é importante correlação do Criminal Compliance pelo instrumento de due dilligence para eliminar ou neutralizar o risco e controlar a atuação dos subordinados.

Por fim, resta evidente como o programa de Criminal Compliance pode vir a reduzir inúmeros inconvenientes e evitar calamidades cujos danos são imensuráveis. Pois, o revés de ambas calamidades sinalizam negativamente a imagem da mineradora multinacional brasileira Vale S.A., já que a referida empresa ainda figura no polo passivo (ré) em ação penal junto a Justiça Federal por crimes de inundação, desabamento, lesão corporal e homicídio, além de crimes ambientais, tudo na modalidade de dolo eventual (quando assume o risco do resultado). Na mesma ação figuram no polo passivo as empresas Samarco e BHP Billiton, e envolvem cerca de 21 réus. Com efeito, além da repercussão negativa da credibilidade da Vale pela desaprovação dos acionistas frente os resultados nas Bolsas (Bovespa e NY), junto da (s) consequência (s) criminal (is) pelas condutas omissivas, sem deixar de contar o impacto financeiro para reparação dos danos, observar-se-á que o ápice do martírio de seus gestores será a memória consagrada pelas tragédias nos últimos três anos, tanto para os familiares das vítimas, os sobreviventes, o ecossistema e as ruínas para com as futuras gerações. E, esse alto custo poderia ter sido evitado quando de um bom programa de Criminal Compliance eficaz.

Fonte https://www.campello.adv.br/blog/brumadinhoobis-in-idem-da-vida-na-lama

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Crime. continuar lendo

Não restam dúvidas de que é crime.

Mas a par do que a lei estabeleça sobre os limites da responsabilização, sabemos bem que a culpa não é só da empresa e seus membros.

Todos os governos, federais e estaduais, fizeram pouco caso das práticas de baixa segurança destas barragens.

Um decreto escroto assinado por Dilma, deu às mineradoras vantagens, na medida do possível, em relação ao que ocorreu em Mariana.

Aliás, o então governador, Fernando Pimentel, empossado em jan/2015, viu a tragédia (nov/2015) e não tomou as devidas providências ... mesmo a título de pressão política sobre o governo federal da sua companheira de partido, e após Temer ... nos 3 anos seguintes de mandato.

Agora a população de Brumadinho colhe os frutos amargos da politicagem.

A burocracia é a melhor amiga da corrupção ... que comece o festival de recursos judiciais ad infinitum. continuar lendo

Brumadinho é consequência do Decreto de Mariana. continuar lendo

Arnaldo, ótimo comentário!

O fato é que, em verdade, a burocracia Estatal deveria constituir óbices para liberação ou autorização de atividades corporativas, inclusive daquelas que envolvem extremo risco ou cujos danos são presumidos. No caso concreto, notadamente deveria haver um sistema de contenção na hipótese de rompimento da barragem (ou qualquer outra catástrofe meteorológica), mecanismos de alerta (eficazes) para população, etc.

Enfim, não se perde de vista que a chamada "cegueira deliberada" também ocorreu por parte do Poder Público, sem que fosse realizada qualquer investida de fiscalização.

A demagogia de que "pareceres" apontaram "regularidade" na verdade omitiam pontos relevantes, já que a realidade revelou o oposto.

Ora, não é admissível que a ineficácia da prestação Estatal repouse no cidadão.

Agora nos resta aguardar as cenas dos próximos capítulos desse drama, lamentavelmente. continuar lendo

Crime - Art. 225, § 3º, CF/1988 - Responsabilidade Objetiva.

CAPÍTULO VI

DO MEIO AMBIENTE

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; (Regulamento)

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; (Regulamento) (Regulamento) (Regulamento) (Regulamento)

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (Regulamento)

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (Regulamento)

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (Regulamento)

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. (Regulamento)

§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. continuar lendo